A Frida Kahlo
I
Não é a paisagem que muda,
mas quem a vê.
A xícara sobre a mesa
não molha o corpo
nem aquece a vida,
mas o café.
A xícara sobre a mesa
não é paisagem,
nem a chuva sobre o corpo,
mas o corpo.
A forma em si
não se revela,
não basta vê-la
é preciso criá-la...
II
a faca não vive,
mas corta;
a vida pulsa,
mas não corta.
(O corte da vida
não está na faca,
mas no sangue;
o sangue da faca
não está na vida,
mas na faca.)
A faca e a vida
estão no mesmo corte,
assim como o sangue
está na faca e na vida.
Mas a vida da faca
não está no sangue
e o sangue da vida
não está na faca,
nem na paisagem que não muda,
mas em quem a vê.
III
(A arte não está no mundo
como o café está na xícara,
mas o café derramado
escorre tanto na tela
quanto na vida;
mais na vida que na tela,
mais no corpo que na chuva,
mais na mesa que na xícara.)
Quem procura a arte
encontra a si mesmo,
como girassóis sob o sol.
Quem encontra a arte
nega toda imagem,
cega todo espelho.
IV
O rio não nasce rio,
nasce fonte,
e a fonte assim como o rio,
nasce água.
Cultivar uma semente
é pintá-la,
não com rio
nem com fonte,
mas com água
que vem do rio,
com água
que vem da fonte.
Assim, o pão
que vem do trigo,
vem da água,
não do rio,
e a vida
que vem do útero,
vem da água,
não da fonte.
Águas que deságuam
em outras águas,
tecendo teias,
criando rios;
no tempo
que do tempo faz
a vala comum
de todo vestígio.
Nessa tela
pode o amanhã ser um traço,
o branco virar pássaro,
a sombra o vazio.
Um comentário:
Parabéns, uma das mais belas poesias que já li!
Postar um comentário